domingo, março 11, 2007

A negra verdade


Estive recentemente numa entrevista de trabalho onde solicitaram o preenchimento de uma “Ficha de Igualdade de Oportunidades”. Quando cheguei à entrevista perguntaram-me, espantadíssimos, porque teria escrito no questionário que era branca. Basta olhar para a minha fotografia que ilustra a crónica, para perceber que é difícil a confusão. Talvez por isso, eu respondi que, tendo em conta o anonimato do dito questionário, possivelmente, estavam a olhar para a ficha do anterior candidato.
Pelos vistos a cor da minha pele era relevante num questionário para contribuir para a “igualdade de oportunidades”. Qual a razão que será assim tão importante saber a raça de uma pessoa?
É preciso recordar que estas fichas de igualdade nasceram da afirmação das identidades e da preocupação da afirmação de um certo multiculturalismo, tão cara aos anglo-saxónicos.
A campanha de nomeação à candidatura presidencial dos Estados Unidos da América é exemplo disso mesmo. Os norte-americanos só sossegam quando conseguem definir racialmente uma pessoa: branca, negra, hispânica, asiática, e quando alguém, aparentemente, foge a este perfil pré-definido, instala-se a confusão.
Recentemente, os media agitaram-se com a candente questão se Barack Obama é negro ou branco. As sondagens foram escrutinadas a esse respeito: dizia-se que a maioria dos “afro-americanos” não se reconheciam no candidato, daí, a certa altura, a maioria dos negros declararem que iam votar em Hillary Clinton. Houve até jornalistas que perguntaram: “Será Obama suficientemente negro”?
Mas, ao longo da campanha as coisas foram-se alterando: se é verdade que as primeiras sondagens davam Hillary Clinton como a candidata favorita dos afro-americanos à presidência dos Estados Unidos, factores recentes alteraram o sentido de voto destes eleitores, dando a maioria das intenções de votos a Obama. A explicação dessa mudança pode ser surpreendente. O voto dos negros depende de muito mais coisas do que a cor da sua pele. O negros norte-americanos já votaram preferencialmente nos republicanos, graças ao papel histórico de Abraham Lincoln, tendo esta tendência sido invertida devido às políticas sociais de Franklin Roosevelt. Os negros americanos conquistaram, com a sua luta, o direito a serem candidatos e certamente valorizam esse facto. Mas, a queda de Hillary nas sondagens deve-se essencialmente ao seu apoio à guerra do Iraque. É preciso dizer que no centro do Império a maioria da “carne para canhão” que integra as tropas norte-americanas são negros e hispânicos. O que, também fez com os eleitores afro-americanos alterassem o seu sentido de voto foram as propostas sociais e ambientais de Obama e o facto deste candidato não ter medo da verdade. Obama ou contrário de outros que declararam pecadilhos da juventude, mas garantiu nunca ter “inalado”, não receou confirmar, numa entrevista, que tinha consumido cocaína e não teve medo, de desde o início, lutou contra a invasão do Iraque e a ideia de uma política internacional baseada nos mísseis. E isso faz toda a diferença.

Monica Frechaut
www.esquerda.net