quinta-feira, março 02, 2006

“VOTO A PRETO E BRANCO: PRESIDENCIAIS PORTUGUESAS OU LEGISLATIVAS CABO-VERDIANAS?”


A. Mendes é natural da Ilha de Santiago, vive em Setúbal há dezoito anos: os seus filhos Miguel e Isolina já nasceram em Portugal. Em casa, depois de se saber quem matou o António e quando o Benfica não joga, ouve-se o Gil Semedo e a sua nha namorada. Fala-se do moçambicano José Castelo Branco, do trabalho na Obra e, de vez em quando, fala-se também de alguns políticos portugueses e cabo-verdianos, sobretudo quando estes visitam o bairro. “O bairro precisa de obras e limpeza”, avisa A. Mendes, quando vê os candidatos indignarem-se contra o lixo na rua, as más condições das casas, a precariedade laboral que muitos dos habitantes do bairro estão sujeitos, o insucesso e abandono escolar dos filhos e filhas de imigrantes. Mas a quem poderá A. Mendes pedir auxílio? Pois a 22 de Janeiro decide-se não apenas quem vai ser o novo Presidente da República de Portugal, mas também qual vai ser o novo PM de Cabo-Verde, bem como, a composição da Assembleia da República deste país.
São seis os candidatos que, em Portugal, concorrem à Presidência da República e em Cabo-Verde, cinco partidos políticos disputarão as eleições legislativas de 22 de Janeiro.
Na casa de A. Mendes, a discussão política é escassa, reconhecem-se os candidatos, mas desconhecem-se os seus programas, mas neste contexto eleitoral, importa perceber qual a relevância de cada um dos diferentes actos eleitorais para as e os cabo-verdianos residentes no distrito de Setúbal: presidenciais portuguesas ou legislativas cabo-verdianas? Para A. Mendes, o natural seria a participação nas eleições portuguesas uma vez que vive em Portugal e contribui económica, social e culturalmente para o desenvolvimento deste país. Ele não pretende regressar a Cabo Verde.
Tem a sua casa, os seus familiares e amigos em Portugal. Contudo, A. Mendes não tem direito ao voto nas presidenciais. Ele não vai poder escolher quem vai ser o novo Presidente da República do país onde vive.
A. Mendes reconhece no voto a possibilidade dos imigrantes se integrarem na sociedade portuguesa, de expressarem e advogarem os seus pontos de vista e ideais e a oportunidade de assumirem, plenamente, as suas responsabilidades. Ele considera que é um dever do Presidente da República incentivar a participação cidadã e a defesa da inclusão de todos e todas na cidadania.

Parece-me essencial para a plena integração dos imigrantes em Portugal, a legalização de todos os que aqui residem, uma nova lei da nacionalidade que consagre o direito de solo, jus solis, ou seja, quem nasce em Portugal tem que ter o direito de ser português e o direito ao voto dos imigrantes em todas as eleições de âmbito nacional.
Este é, também, o desejo de A. Mendes.

Mónica Frechaut

Publicado no jornal on-line Setúbal na rede (09-01-2006)
imagem retirada de http://kapverden.nano-web.de/albums/santiago_monte_graciosa_2003/montegraciosa_01.jpg